“Clarice Lispector era surpreendente em
tudo, inclusive nos títulos que dava às suas obras. Exemplo é a curta (155
páginas) novela publicada pela primeira vez em 1969 e que se chama Uma Aprendizagem, ou O Livro dos Prazeres”. Escreveu na revista CartaCapital o saudoso
escritor gaúcho Moacyr Scliar.
“O que está
no dizendo Clarice?”. Pergunta ele em
seu texto ao mesmo tempo em que sai respondendo, concluindo que aprender com
prazer é o princípio básico de toda a pedagogia e é o que todos verdadeiros
mestres sabem e praticam. O escritor conta que Clarice enfatiza o valor da
entrega, do amor como antídotos para a falsidade e a hipocrisia.
A escritora diz: “Não temos amado acima de
todas as coisas.” Scliar lembra: o
1° Mandamento fala em “amar a Deus acima de todas as coisas”. Mas,
segundo ele, não é somente amar a Deus que a escritora está dizendo. É amar a
tudo e a todos, entregar-se; não adianta amontoar “coisas e segurança”, nem
buscar alegrias catalogadas, estereotipadas.
E Scliar prossegue: “apesar dos riscos, apesar
dos obstáculos, apesar dos pesares, deve-se viver, deve-se comer, deve-se amar,
deve-se morrer – morrer, sim; é parte da vida". E nos versos Clarice canta, assim como Chico
Buarque cantou tentando enganar a Ditadura.
“Aprendi que se deve viver apesar de.
Apesar de, se deve comer.
Apesar de, se deve amar.
Apesar de, se deve morrer”.
E Scliar conclui, brilhantemente, que o
livro de Clarice Lispector descreve uma aprendizagem que implica
prazeres: “o prazer da entrega, o prazer de amar, mas também o prazer da
própria aprendizagem”. É isto que Clarice nos ensina, diz ele.
Com base em texto de Moacyr Scliar, na revista CartaCapital, "À mestra com carinho".